Abandonei um item de trabalho do meu kanban, e agora?

Depois de iniciar o trabalho em um determinado item, o time chega à conclusão de que não faz mais sentido prosseguir e que devem abandoná-lo. E a agora?

  • Removemos o item do quadro e segue a vida?
  • Registramos em algum lugar?
  • Movemos para alguma área especial do quadro?
  • E as métricas, como ficam?

É comum que esta situação crie dilemas, principalmente se o time já adota métricas de processo. Neste texto recomendarei como lidar com esta situação.

Não deixe de conferir este outro texto que escrevi sobre mais um dilema muito comum: O de mover para trás ou não os itens do quadro kanban:
Neste Link.

Tempo e dinheiro jogados fora


Abandonar um item de trabalho iniciado é desperdício. Significa que as etapas anteriores do processo não estão conseguindo garantir que estamos trabalhando na coisa certa. O esforço de refinamento, desenvolvimento e validação empregado até aqui foi jogado fora e isto custa bem caro. Alías, quanto mais tardiamente descobrimos que algo deve ser abandonado, mais caro custa.

Este tipo de desperdício é classificado pelo Lean Institute como muda:

Qualquer atividade que consuma recursos sem criar valor para ao cliente.

A seguir listei as principais recomendações que costumam funcionar nesta situação:

Antes de qualquer coisa, avalie a frequência do fenômeno


Reduzir desperdício é um dos mantras da filosofia Lean, algo que deve ser perseguido para que o fluxo de trabalho seja saudável.

Se no seu caso acontece um abandono a cada 6 meses, talvez o custo de se adotar as medidas que vou recomendar a seguir seja maior que o retorno obtido como resultado delas. Se for este o caso, elimine o item e siga em frente. Caso contrário, considere adotar as medidas a abaixo:

Dê visibilidade para o abandono


Tornar visível o abandono de itens ajuda a entender o fenômeno e suas causas, bem como transmitir às outras pessoas a importância de se resolver o problema.

Usando o quadro kanban
Considere ter em seu quadro kanban alguma área específica para onde itens abandonados serão transportados e agrupados pelo motivo do abadono. Deste modo, com uma espiada saberíamos responder quantos e quais abandonos aconteceram em um determinado período de tempo e também quais os principais motivos de desperdício.

Usando métricas de processo
Considere também adotar métricas que falem sobre o abandono de itens, pois de posse de dados seremos capazes de diagnosticar melhor a situação.

Podemos pensar em medições que respondam perguntas como estas:

  • Quantos itens abandonamos nesta semana ou no período de tempo “x”?
  • Em que etapa estavam os itens quando foram abandonados?
  • Que proporção da nossa capacidade é desperdiçada com itens abandonados? Esta proporção está aumentando ou diminuindo?

Que poderiam ser representadas por visualizações como estas:

Comparativo entre a quantidade de itens entregues e abandonados semanalmente.

Abandonos semanais por etapa do fluxo.

Vale ressaltar que para obter insigths é importante combinar as métricas e visualizações sugeridas acima com medições de fluxo habituais, como por exemplo o lead time. Deste modo seria possível entender quando tempo do time foi investido em um item posteriormente abandonado e refletir sobre as consequências disso.

Algumas ferramentas digitais como o SwiftKanban oferecem recursos para medições e visualizações como as que recomendei.

Diagnostique a situação e lide com o desperdício


Dado que agora possuímos instrumentos que proporcionam visibilidade para o problema, é hora de interpretar os dados e diagnosticar a situação.

Um primero passo nesta direção seria, em algum encontro que vise melhoria contínua:

  • Agrupar os itens abandonados pelo motivo do abandono;
  • Selecionar qual dos motivos deve ser objeto de uma investigação mais profunda (o mais frequente, o que mais desperdiça tempo ou dinheiro, etc);
  • Investigar a causa raiz do problema;
  • Colocar em andamento um plano de ação para atacar a causa raiz;

Para facilitar uma dinâmica como esta, você pode buscar inspiração neste artigo do Troy Magennis e neste outro do Klaus Leopold, ambos abordam uma técnica de agrupamento de blockers que pode ser transportada para o contexto do abandono de itens.

Após compreender as origens dos abandonos e colocar o plano de ação em andamento, acompanhe o comportamento do sistema afim de entender se as medidas adotadas proporcionaram uma redução no desperdício (usando as métricas sugeridas, por exemplo). Caso o resultado não tenha sido positivo, repense o plano de ação.

Acredito que o tipo de análise feita nesta etapa tem conexão com a cadência Risk Review do Kanban, no fim das contas estamos analisando um risco e tomando ações para controlá-lo ou eliminá-lo. Recomendo a leitura deste texto do David Anderson para esclarecer esta conexão.

Técnicas como Upstream Kanban podem ajudar


Um dos motivos mais recorrentes para o abandono está relacionado a refinamento e priorização insuficientes, que acabam por permitir que itens de trabalho que ainda não satisfaçam os critérios mínimos para que sejam codificados iniciem sua jornada pelo fluxo de desenvolvimento e depois gerem desperdício.

Sabendo disso, esteja atento para promover melhorias nas etapas de “preparo”, usando técnicas como o Upstream Kanban.

Proposta por Patrick Steyaert, a ideia do Upstream Kanban é garantir que esteja disponível um inventário de “opções” bem definidas e valorosas, para que quando o time escolha se comprometer com alguma delas e levá-la ao Downstream, a chance de desperdício seja a menor possível.

A modelagem do processo no Upstream inclusive incentiva o descarte de opções que não se mostram viáveis ou valorosas o suficiente. Neste caso descartar é vantajoso, pois está sendo feito antecipadamente enquanto o investimento de esforço ainda é baixo naquele item.

Fonte: Essential Upstream Kanban, Patrick Steyaert.

Para se aprofundar no assunto, recomendo a leitura do Essential Upstream Kanban, um ebook gratuito escrito pelo próprio Patrick.

Finalizando


Condensei no texto as principais recomendações que costumo fornecer (e que costumam ter efeito positivo) para quando se deseja lidar com desperdício no fluxo de trabalho. No fim das contas, estamos falando sobre tornar o fluxo visível e concordar em melhorá-lo evolutivamente, algumas das práticas e princípios mais marcantes do Kanban.

E para você? Como tem sido lidar com desperdício no seu contexto?

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